sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Sexta-feira


Um homem acordou com a arma em sua mão direita. Levantou, andou, mas não atirou. Sem soltar a arma, chamou todos da casa e expulsou. Todos para fora. O homem sozinho em casa com a arma, fez-se refém de si mesmo.

Chamaram a polícia, ela cercou a casa, os parentes choravam enquanto o homem apontava a arma, carregada, para a própria cabeça. A ameaça era simples, a ameaça era sua vida.

O homem, seis balas e sua avó. A avó, chorando, tentou aproximar-se da casa. Chorou e disse que aquele não era quem um dia foi seu neto e quem um dia ela ajudou a criar. O homem disse que ela tinha razão. Um tiro na coxa, ela voltou sangrando.

O homem, cinco balas, seu irmão. O irmão, nervoso, sem chorar, disse que falaria. Perguntou que porra era aquela, perguntou de onde o homem tirou aquela arma, perguntou que merda estava rolando naquela cabeça de bosta para apontar o ferro carregado para a própria orelha. O homem respondeu que não iria machuca-lo, mandou voltar. Um tiro para o alto, a polícia correu, carregou o irmão para a segurança.

O homem, quatro balas, seu pai. O pai, chorando, perguntou onde estava o homem que ele ensinou a ser Homem. O então rapaz disse que estava ali, que aquilo, enfim, era o que tinham ensinado ele a ser. O pai perguntou o que faltou, quem faltou, porque faltou. O homem disse que se o pai não saberia, ele não haveria de dizer. O pai implorou, o homem ignorou. Um tiro em direção ao pai, um tiro errado, um policial sangrando.

O homem, três balas, sua mãe. A mãe nada disse, correu, chorou, correu e chorou novamente. O filho olhou e tirou a arma da própria cabeça. A mãe olhou e esboçou um sorriso. O filho levantou, sem arma na cabeça, com a arma ainda em mãos. A mãe levantou, ainda segurando o choro. O filho andou até a porta e a trancou, voltou para o seu interior com a arma apontada para a cabeça. A mãe chorou, o pai buscou e abraçou. Um tiro para o alto, segundo tiro para o alto, nada mudou.

O homem, duas balas, o telefone. O telefone toca, o homem atende. Uma voz feminina diz para parar. Uma voz feminina diz que não há porque para aquilo, uma voz diz que o que acabou, acabou. A voz diz que ajudaria, que não desapareceria, mas que a arma não seria solução. O homem em silêncio. O homem desliga o telefone, vai até a janela e ri, aquilo para ele nunca importou. Um tiro em direção a estante, um telefone quebrado, vinte e três reais perdidos.

O homem, uma bala, o homem. Ninguém mais fala além do homem, e ele nada diz. O homem tem uma bala, todos sabem o que há de se fazer. O homem não sabe. O homem acordou com uma arma em sua mão direita, e em sua arma haviam seis balas. O homem possui uma bala e uma arma em seu crânio. O homem sorri. O homem com sua arma sorri. O homem segura firme a sua arma, o homem caminha e destranca a porta. O homem com seu sorriso e sua arma saem de casa. A mãe, o pai e o irmão olham. A multidão olha e nada diz. O homem com sua arma em mãos e seu sorriso em face olha para todos. O homem joga a arma no chão.

A polícia avança. A mãe, o pai e o irmão choram. O homem sorri.

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